terça-feira, setembro 30, 2008

Ato de depilar I

Fazem caras e bocas,
cAbelo, pêlO, peNteLHo
Crescem sem vergonha
Se exibem no meu espelho.

Íntimos do tempo,
Escancaram o não toque.
Me enchem de raiva
E pedem sempre retoque

Se alongam com a espera,
Se alisam com a preguiça,
Emaranhado de quereres,
É a vida que enguiça.

Gilete, Pinça, Cera
Exterminar o natural.
Arrancar memorias póstumas.
Minha atitude feminina e banal.

Os poros estão abertos,
os pêlos cobrem o chão.
Por que meus problemas não
são arrancados com uma boa depilação?

Sem pêlos, só pele.
Estarei a dançar.
Macia me machuco
A espera de um tocar.

sexta-feira, setembro 26, 2008

Água Nova

Depois de secos meses, ela decide benzer as linhas da cidade. O cheiro de terra molhada invade o asfalto amplo e fica mais fácil sorrir sem motivo. É como se a preguiça convidasse o nosso corpo cansado da aridez quase-eterna para dar uma voltinha no parque. Trilha sonora leve, brisa calma. O céu antes colorido, fica todo cinza - cinza-azulado – e de repente, a noite visita o dia. É mágico ver o sol ceder espaço imediato para nossa escuridão urbana. Ai, ela vem e me abraça. Deságua desejos. Traz a certeza que o fim é sempre começo de algo novo. Limpa, invade o peito, encharca os olhos. A chuva molha todas as frestas. Me acalma a pele. Suavemente eu me dissolvo e sou levada pelo destino incerto das lágrimas celestes. Os traços da cidade ficam borrados. Pessoas intocadas buscam o toque urgentemente. E o meu confortável edredom preto me abraça. Espaço duplo para um corpo só. Mas a moça se exibe e dança sobre os meus antigos vidros embaçados. Ela lava minha alma. Sou água nova sobre a cidade cimento.






espaço duplo, um corpo só.



Desenho do Taigo Meirelles

quinta-feira, setembro 18, 2008

Aquela parte que se esconde atrás da imagem do espelho distorcido.



desenho Taigo Meirelles
foto e photo eu e eu mesma

Escancarada, repetitiva e deitada na sua cama. Faço poses descompassadas enquanto suplico que teus olhos seletivos apreciem a minha obra inacabada. Eu, um emaranhado de traços e letras. O caos orgânico urbano. A mistura exata entre a virgem e a puta. Entregue. Saudosa. Inteira. Deitada. À espera de você, minha rima boemia. Do gosto embriagado. Dos desenhos derretidos. Da voz grave. Eu danço um jazz rouco sobre a sua cama vazia - caço o cheiro, suor, cacho de cabelo - quero ser a tua tela em branco. Mas por enquanto é o silêncio que me pinta.

terça-feira, setembro 09, 2008

Entrelinhas

Tem lama na minha garganta. E a minha voz tá mais rouca que o normal. Sinto que não adianta esticar as minhas mãos para tentar agarrar o que certamente não quer ser meu. Meus cabelos estão longos com essa espera inútil. E a saudade continua a mesma. É como se não tivesse chegado. É como tivesse se perdido por ai. É como houvesse uma música arranhada dentro do meu disco favorito. Essa esperança morta me beija ao amanhecer. Os meus versos são rasgados um a um. Meu desejo é destruído lentamente de uma forma tola e dolorosa. Tenho uma fome insaciável. Tenho uma dor muda. Tenho uma tática falida. Recebo um beijo no canto da boca que atiça a minha língua nervosa. Gritos seriam providenciais nesse instante. Eu conheço bem a previsão do futuro e chego a sentir saudade daquele passado inventado. Pra onde foi, em? Pra onde foi a poesia que estava aqui? A ausência que cobre o meu peito me deixa ainda mais bonita. E eu sou atacada por olhares indesejados. Todas as bocas querem a minha. Todas as mãos, os meus pedaços. Mas eu ainda tenho como foco aquele mesmo vazio. É como se a minha pele quisesse redescobrir o cheiro daquela rima perdida, a fuga aumentasse o desejo do caçador pela presa e o quase beijo me levasse a um desespero agradável. É, talvez a loucura seja um caminho sem volta.


terça-feira, setembro 02, 2008


Em caso de dor, movimentO.

Minha fumaça corre com ventO.

Esse amor vai se perder no tempO.

A comida sempre vira excrementO.

Tem excesso de palavra, meu silênciO.